domingo, 19 de junho de 2011

Acabou o recreio

Não consigo nem quero esconder a satisfação de ver o tempo encarregar-se de expor a vacuidade política e a inutilidade do Bloco de Esquerda.

Foi uma década de crescimento baseado em ser contra tudo, demagogia e populismo económico. O apoio a duas ou três "causas fracturantes" como a despenalização do aborto e o casamento gay emprestaram-lhe uma falsa aura de partido urbano e modernaço, cool até. Não foi mais do que mascarar uma ideologia serôdia, importada das catacumbas da URSS. Francisco Louçã fez um trabalho admirável ao costurar um partido com retalhos de movimentos com diferentes graus de fanatismo e fantasia.

Agora que a festa acabou e o país acordou para as difíceis mudanças que irá ter de fazer, o constante metralhar de Louçã, de inquisidor dedo em riste, já não parece muito boa ideia. Se for para votar numa visão antiquada e desfasada da realidade mais vale votar PCP, esses sempre parecem mais credíveis nesse papel do que a esquerda caviar do Chiado e da Universidade de Coimbra.

Num partido que é um one-man show, três erros consecutivos e caracteristicamente oportunistas de Louçã foram o suficiente para dizimar meia bancada parlamentar: apoio precoce a Alegre numa pueril tentativa de parecer condicionar o PS; moção de censura à última da hora para se antecipar ao PCP e que o obrigou a ajudar a Direita a derrubar Sócrates poucas semanas depois; recusar-se reunir com a troika. Aquele a quem o futuro ex-primeiro ministro chamou de sobrinho da tia mansO é agora acossado por egos semelhantes ao seu (ex: Joana Amaral Dias), militantes com posicionamento diferente (dentro da mesma mundividência distorcida) (ex: Daniel OlivieraI) e independentes que acreditaram que o Bloco era mesmo um partido da esquerda moderna e trendy (ex: Rui Tavares).

O tempo é implacável e cedo ou tarde a falta de uma filosofia construtiva teria de dar sinais. Foi bom que tivessem sido os eleitores a dar o tiro de partida para a luta no saco de gatos. O Bloco acabará inevitavelmente dividido, em pelo menos duas partes: os idealistas e os pragmáticos. Começo pelos segundos. Os pragmáticos têm noção que o Bloco não existe, é apenas uma cápsula cujo combustível é Louçã. Nunca Luís Fazenda e Companhia terão o carisma do actual líder. Esses ficarão com Louçã até ao fim.

Os idealistas tentarão fazer do Bloco aquilo que imaginavam. Esse possível Bloco terá pouco lugar numa Europa que claramente avançou alguns graus em direcção à liberdade individual. A esquerda reduzida terá de consolidar-se numa alternativa main-stream. Esse lugar será preenchido pelo PS, encostado à esquerda pela inevitável alternância na ocupação do centro pelo partido do poder.

O Bloco de Esquerda representa de forma singular o delírio de um país que viveu acima do que podia, que tirou os pés do chão. Este constante protesto sem apresentar alternativas é outro dos luxos sem os quais teremos de aprender viver. Fossem todos os sacrifícios tão agradáveis.

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