quarta-feira, 30 de maio de 2012

Fosso de expectativas

Tem corrido a blogosfera esta reportagem da SIC. Duas empresas do Vale do Ave procuram 200 costureiras, não as encontram e recorrem por isso a empresas de trabalho temporário. Ao mesmo tempo, temos uma taxa de desemprego recorde na nossa história recente. A notícia não pode por isso deixar de suscitar reflexão, especialmente quando mais uma voz critica um regime de subsídio de desemprego que desincentiva o trabalho.

Não vou daqui extrapolar que uma boa parte do desemprego e do emprego precário se resolveria se as pessoas aceitassem ofertas menos sexy. Mas esta notícia é mais um dado a confirmar o gigantesco fosso entre aquelas que são as expectativas dos desempregados e a realidade da oferta do mercado de trabalho.

Ainda que a formação da nossa população activa e as suas expectativas fossem totalmente adequadas à realidade do nosso tecido económico, teríamos uma taxa de desemprego dramática. É inevitável. Vivemos décadas com poupança negativa, isto é, gastando mais do que a riqueza gerada. E essa despesa não foi, longe disso, em investimento produtivo que nos serviria agora para produzir os excedentes que compensariam os défices do passado. Não estamos a empobrecer, apenas a perceber que não éramos tão ricos como pensávamos.

Não tenho uma visão mesquinha do nosso país sem lugar para ambição e desenvolvimento. Percorremos um caminho notável. Contudo, nesse mesmo período menosprezámos as indústrias tradicionais, desprezando os supostos salários baixos, enquanto subsidiámos indústrias de ponta cuja tecnologia era e é estrangeira. Abrimos e subsidiámos cursos superiores sem qualquer utilidade em Portugal ou lá fora enquanto acabámos com o ensino técnico. O resultado é uma crescente legião de cidadãos com mais formação e ambição do que nunca, que esbarram na realidade da inutilidade do que aprenderam.

Assim, volto ao recorrente tema da responsabilidade do Estado que alimentou (e alimenta) ilusões e incentivou os mais jovens a fazerem escolhas erradas ao mesmo tempo que ergueu barreiras a soluções mais úteis. Mais uma dificuldade, talvez a original, e que nos obriga a reganhar a capacidade de luta e de iniciativa que o nanny state nos fez acreditar não ser necessária.

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